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28/11/2013 - 23h23 | Atualizado em 28/11/2013 - 23h23
Por João Batista Firmino - Perito médico previdenciário

Complexo de M(édipo)

Vivemos atualmente numa luta ferrenha entre Governo, Medicina e Profissionais de Saúde não médicos. Um verdadeiro rolo compressor em cima dos Médicos. Lembrei-me, então, dos tempos acadêmicos em que estudávamos, nas disciplinas de Psiquiatria/Psicologia Médica, o conhecido Complexo de Édipo.

Não vamos perder tempo, comentando o significado dos Complexos de Édipo e Electra, todavia o trocadilho “forçado” da epígrafe acima é exatamente o que me parece vir ocorrendo, notadamente com nossos colegas não médicos.

No dia a dia, costumo perguntar às pessoas em geral a quem procurariam se acordassem no meio da noite com intensas dores, sangrando abundantemente ou simplesmente sem poder respirar: todas as respostas são unânimes no sentido de buscarem ajuda Médica.

Por outro lado, tal consenso muda bastante quando perguntamos sobre o que acham dos Médicos em geral. Muitos respondem que médicos são mercenários, arrogantes, incompetentes, entre outros adjetivos nada agradáveis para nós.

Percebem a contradição? O conflito ódio-amor das pessoas, inclusive e, lamentavelmente, dos profissionais não médicos? Afirmo: só nós que fazemos uma Medicina honrada e tecnicamente irrepreensível teremos a capacidade de iniciarmos o tratamento adequado de tal transtorno psicossocial (a expressão da moda hoje em dia).

Pelo menos na época em que estudei Semiologia, aprendi a preencher os formulários de Observação Clínica que nunca deixaram dúvidas sobre a obrigação médica de analisarmos tanto os aspectos físicos, quanto os familiares, profissionais, mentais, emocionais e, sim, sociais (história de vida do paciente).

Cabe bem aqui a ideia de que nós médicos temos que ser também um pouco psicólogos, filósofos e sociólogos por pura necessidade de trabalho e a despeito da existência de tais profissionais, ou seja, interagindo e integrando a área de conhecimentos de ciências da saúde com a área de ciências humanas.

Durante anos, observamos a Medicina se enredando, não por culpa própria, no gigantesco acervo de conhecimentos (novos procedimentos diagnósticos armados, imaginologia, novos exames laboratoriais, cada vez mais ramificações de especialidades médicas, afastando - e impedindo - a Medicina do Paciente - pessoa).

Já passa da hora de acordarmos para uma profunda reflexão sobre toda essa conjuntura. Como harmonizar Medicina de qualidade com nossas numerosas especialidades em meio a toda essa carência afetiva dos nossos filhos (pacientes edipianos) que tanto nos criticam (vetos ao Ato Médico, por exemplo) quanto nos amam (Políticos e Governantes indo rapidamente aos centros de excelência para tratamento de suas doenças, enquanto os mais humildes não conseguem atendimento digno no SUS)?

Por agora, só me chega à mente uma saída: começarmos (aqueles de nós que ainda não o fizeram) a empregar na prática clínica aquilo que sabemos ser imprescindível em toda e qualquer avaliação médica inicial: ouvir, ouvir, ouvir; examinar, examinar; conversar, interagir, explicar o que sabemos e o que não sabemos sobre o diagnóstico nosológico, a prescrição terapêutica e o prognóstico dos nossos pacientes edipianos ou não.

A Medicina não mudou em sua essência; mudaram a Sociedade e algumas Escolas Médicas (inadequadas), possivelmente em função do rápido avanço tecnológico desproporcionalmente à má adaptação das pessoas ao mesmo e de muitos médicos a esse contexto de vida.

Enfim, a melhor defesa da Medicina que tanto amamos reside na prática constante de uma Medicina com amor, técnica e paciência, mesmo e apesar das dificuldades hoje existentes com excesso de tecnologia e urgente necessidade de tratarmos uma sociedade doente (Síndrome de Carência Médica Afetiva, se me permitem a expressão), mormente atingindo absurdamente nossos pacientes profissionais de saúde não médicos.


* Publicado originalmente no Portal do CFM no dia 18 de Novembro de 2013



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